Escolas democráticas (?)

Gostaria de compartilhar com vocês o que acredito que toda escola deveria trabalhar. E, para isso, lanço mão do texto “Os cinco saberes do pensamento complexo”, de Humberto Mariotti. São eles: saber ver, saber esperar, saber conversar, saber amar e saber abraçar. Comentarei três.

Em relação a “Saber ver”, interessante quando o autor destaca que, em algumas tribos da África do Sul, quando uma pessoa cumprimenta outra, fala algo que, em português, quer dizer “eu vejo você”. E a pessoa que foi cumprimentada responde “estou aqui”. Em outras tribos da África, se alguém passa e o outro não cumprimenta, é como se tivesse negado a sua existência.

A sabedoria dessa tradição nos diz simplesmente que você passa a existir quando alguém vê você. “Uma pessoa se torna uma pessoa por causa das outras”.

Estamos conseguindo ver nossos alunos? Referendar suas existências enquanto sujeitos complexos, cheios de paradoxos e contradições? Pedras a serem lapidadas?

Mariotti destaca que a “dominação” da visão sobre os outros sentidos, a apropriação do olhar pela cultura dominante, estreita nossa percepção de mundo. E cita o romance "Ensaio sobre a cegueira", de José Saramago, como uma espécie de metáfora dessa realidade. A partir do momento em que perdem seu sentido primordial, as pessoas (no romance) até tentam resgatar uma certa solidariedade, mas o que se vê na maioria delas é o caos, a competição, porque perderam a dimensão total dos sentidos e porque foram mais preparadas para competir do que para a parceria. Para Mariotti “a proposta do pensamento complexo corresponde justamente a uma retomada de pluri-sensorialidade”, sem dominação e um sentido sobre o outro.

Em relação a “Saber esperar” é interessante perceber como a noção de tempo mudou. Tempo virou dinheiro. Já não temos mais paciência de esperar o outro, porque a velocidade tomou conta de nós. Temos diculdade de entender que cada um tem seu tempo para compreender, interpretar, responder.

Nosso conceito de tempo é linear, enquanto nas tradições anteriores à judaico-cristã, o tempo era circular, ou seja, respeitava o ciclo da natureza. Era preciso esperar o tempo de plantar e o de colher; o tempo da chuva e o tempo do sol; a chegada de uma estação do ano. Vivemos nesse ciclo, mas não estamos mais reconhecendo-o.

É importante entender a complementaridade entre esse tempo linear e o tempo circular. O pensamento complexo defende esse abraço.

Mariotti também nos fala do "Saber conversar". Para ele, saber conversar é antes de tudo saber perguntar. Ele ressalta que em nossa cultura muitas vezes o diálogo vira uma espécie de competição para ver quem tem os melhores argumentos. E que, quando perguntamos, na verdade não queremos aprender com o outro ou dar-lhe a chance de aprender com nossa pergunta, mas queremos (mesmo que insconscientemente) colocar o outro em uma situação desconfortável.

Saber perguntar é provocar alterações, mudanças no outro, a partir de perguntas mobilizadoras. É fazê-lo aprender e compatilhar conosco sua aprendizagem. "É estar-com, encontra-se, religar-se, descondicionar-se, libertar-se". Ao perguntar de forma correta nossa postura é de respeito com o outro e sua resposta. "Saber questionar conduz a saber ouvir", afirma.

Da mesma forma, Mariotti nos diz que ensinar é propor questões mobilizadoras, desencadear um processo de co-educação: "Se partirmos do princípio de que o verdadeiro papel dos educadores é formular perguntas adequadas, segue-se que quem os educa são os educandos, ao dar-lhes respostas".

Essa é nossa postura enquanto educadores?

Para nossa reflexão compartilho um vídeo que nos mostra de forma crítica como algumas escolas ainda insistem em funcionar. Sem levar em conta o saber do aluno, sem encará-lo como sujeito da aprendizagem. Sem ver o aluno, esperá-lo, conversar com ele, abrir-se ao diálogo e a escuta.


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